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Como lidar com uma deficiência física ?

 


Como lidar com uma deficiência adquirida? Este é um tema complexo que tentaremos abordar por meio da visão dos pacientes e profissionais do setor.

Lidar com uma deficiência física adquirida é uma questão muito complexa. Esta é uma situação que ocorre com muita frequência e que constitui um grande desafio pessoal devido ao grande choque que gera a nível emocional em praticamente todas as áreas da vida.

De acordo com o Observatório Estadual de Deficiências, a deficiência física (motora ou orgânica) é a mais prevalente hoje. A seguir, propomos algumas ideias para iniciar este novo processo que envolve o enfrentamento de diversos lutos (nossa vida anterior, nossa nova funcionalidade e corpo, outras perdas associadas e, em última instância, a nova realidade que temos que viver).

Como lidar com uma deficiência?




Segundo Anna Gilabert, psicóloga do Institut Guttmann que também sofre uma lesão na medula espinhal devido a um acidente que a obriga a usar uma cadeira de rodas, conviver com uma lesão neurológica e se adaptar a ela não é uma tarefa fácil. Esta psicóloga afirma que esta nova realidade implica enfrentar certas dificuldades em todas as esferas da vida: biológica, psicológica e social.

“O grau de adaptação funcional a esta circunstância vital e a experiência subjetiva de cada um dependerão de diversos fatores: as características da lesão, o ambiente sociocultural, a personalidade, o ciclo de vida, a estrutura familiar… e o gênero”.   - Anna Gilabert -

Cada pessoa terá seus próprios recursos para lidar com a sua deficiência, sejam pessoais ou fornecidos por aqueles ao seu redor. Deixamos aqui algumas primeiras ideias a respeito de como enfrentar uma deficiência, neste caso física e adquirida:

  • Permita-se sentir
Enfrentar uma deficiência física significa enfrentar uma situação complicada porque este é um choque com a nossa vida anterior. Assim, há uma ruptura com o eu de antes e com o eu de agora que exige mudanças e adaptações. Muitas atividades diárias podem gerar um grande choque emocional, por isso é importante nos permitir sentir; todas as emoções são válidas.

Não se reprima nesse sentido e tente remover a culpa dos seus sentimentos. Se eles estão lá, é por um motivo; lembre-se de que as emoções são adaptativas, embora às vezes sejam dolorosas. Além disso, elas irão evoluir se permitirmos que façam isso.

“Não vamos esquecer que as pequenas emoções são as grandes capitãs de nossas vidas, e que as obedecemos sem perceber.”   - Vincent van Gogh -

 

  • Deixe as emoções fluírem
Em consonância com o ponto anterior, deixar que nossas emoções fluam nos permitirá, em parte, dar-lhes espaço e canalizá-las. Nesta fase, em que teremos que ver a deficiência pela primeira vez, será totalmente normal sentir emoções como raiva, tristeza, desamparo, frustração…

Todas elas fazem parte do luto (do qual trataremos no próximo ponto). Por que é importante deixar as emoções fluírem? Porque elas nos ajudarão a nos ajustar à nova realidade. Como afirma a psicóloga Dafne Cataluña, as emoções têm uma série de funções:

Elas evocam conforto quando estamos tristes.

Elas nos distanciam do que é tóxico.

Elas ajudam a criar energia quando algo bloqueia nossos objetivos.

Elas permitem que você busque segurança contra ameaças.

Em última análise, as emoções nos ajudam a sobreviver. Por isso, devemos dar-lhes a importância que merecem e, sobretudo, pedir ajuda psicológica se sentirmos que não sabemos como gerenciá-las.

  • Controle a raiva para lidar com a sua deficiência

Outra ideia que nos ajudará na tarefa de enfrentar uma deficiência é controlar a raiva. Essa é uma emoção que aparece com muita frequência nesse tipo de situação, e é até provável que acabemos descontando em nossos entes queridos por esse desconforto interior que carregamos.

Em primeiro lugar, não se culpe por isso; ouça a si mesmo e entenda por que está agindo assim.

A raiva pode surgir por diversos motivos: pela frustração de não podermos mudar a nova situação, por pensamentos como “por que eu?”, pela raiva de si mesmo por ter feito isso ou aquilo (pensar que poderíamos ter evitado o acidente que nos conduziu a esta nova realidade, por exemplo), etc.

Para administrar essa emoção, devemos entender sua origem e também dar-lhe seu espaço e seu significado. Existem muitas maneiras de canalizar esta e outras emoções: compartilhando a forma como nos sentimos, pedindo ajuda, praticando esportes e outros hobbies, buscando novos desafios, escrevendo, etc.

  • Converse com pessoas na mesma situação

Muitas pessoas que acabam de adquirir uma deficiência física dizem que o que mais as ajuda é conversar com pessoas que já passaram pela mesma coisa. No final das contas, falar com essas pessoas significa falar com quem pode nos entender muito mais do que alguém que não viveu o mesmo, então a empatia é importante aqui.

Fazer isso pode nos ajudar a perceber as muitas coisas que ainda podemos fazer, a compartilhar experiências, dúvidas e sentimentos, a relativizar, a sentir-nos acompanhados, etc. Em última análise, trata-se de ser capaz de observar como os outros superaram esse problema e como conseguiram ser felizes novamente em sua nova realidade.
Experimente uma nova atividade

Seja um esporte, um curso de culinária, uma nova faculdade, um novo desafio… Sem se forçar. Isso pode ajudá-lo a se distanciar da nova realidade, mas de forma saudável, investindo seu tempo e energia em coisas novas que façam você se divertir.

Às vezes, o objetivo não é tanto curtir, mas sair da apatia em que costumamos mergulhar neste tipo de situação.

  • Peça ajuda se precisar



Também será importante cercar-nos dos nossos entes queridos e procurar espaços e pessoas com quem partilhar o que sentimos, além de pedir ajuda profissional quando sentirmos necessidade.

Os hospitais de reabilitação que atendem pessoas que acabaram de adquirir uma deficiência contam com esse tipo de profissional, e isso porque é fundamental administrar a parte emocional de todo esse processo, além da própria reabilitação física (e médica).

Lidar com uma deficiência dá início a uma nova realidade

Como vimos, enfrentar uma deficiência implica um desafio complexo, pois significa enfrentar uma nova realidade em que, embora sejamos os mesmos, muita coisa mudou.

É conveniente saber que este é um caminho, um processo de aceitação. Nele, aos poucos, vamos nos sentindo melhor. É claro que algo assim não será aceito da noite para o dia.

Para enfrentar esta situação, devemos nos apoiar em nosso entorno e trabalhar muito os medos, dúvidas e inseguranças que surgem ao longo do caminho, apostando no nosso bem-estar e lutando pelas coisas que nos fazem sentir bem novamente.

“A deficiência envolve uma situação de crise e mudanças em muitos aspectos da vida de uma pessoa. Cada mudança envolve a necessidade de repensar os próprios valores e a visão de si mesmo e do mundo. Nesse caso, trabalhar o autoconceito é a chave para fazer a pessoa se sentir útil e melhorar seus níveis de autoestima.”

 - Testemunho de uma pessoa com deficiência física adquirida -






“ Que ser humano se consultaria com autista? ” : jovem que sonha virar médica sofre ataques




Hellen Alves

A escolha de uma profissão e o período de preparação para os vestibulares já é normalmente uma época tensa para os estudantes. Para Layne Bregantini, 18 anos, que sonha em ser médica, essa etapa se tornou um momento de sofrimento devido ao ataque que recebe nas redes sociais por ser autista.

Layne está em seu 2º ano de cursinho pré-vestibular com bolsa de 100%. Ao compartilhar a conquista com seus seguidores no Instagram e agradecer à instituição de ensino pela oportunidade, ela recebeu o seguinte comentário: “Entrei no seu perfil e vi que quer fazer Medicina? Você acha mesmo que qualquer ser humano com consciência iria se consultar com uma autista?”.

Publicação feita por Layne para denunciar a situação 
 Foto: Reprodução/Instagram


Em nova publicação, ela afirmou não entender o porquê desses ataques contra autistas. “Confesso que ler me dói e me faz pensar que mesmo antes de entrar em uma faculdade já estou recebendo esses tipo de comentários, penso se terei estrutura para aguentar o que tem por vir, quero acreditar que sim, não vou desistir”, afirmou.

Layne disse ao DCM que sua primeira reação ao ver o comentário foi tirar um print para mostrar para sua mãe. “Estava tão nervosa que bloqueei e excluí a mensagem”, completou. Ela ainda contou que teve apoio de advogados e amigos para caso optasse por um processo, mas não se sentiu pronta para tomar essa atitude.

O advogado Leandro Mathias Novaes, presidente da Comissão do Deficiente Físico da OAB Cotia/SP, explicou que a jovem poderia ter processado o autor do comentário porque “há clara discriminação contra ela, o que caracteriza crime contra pessoa com deficiência”.

Ele ressalta ainda que a legislação específica de proteção ao deficiente (Lei 13.146 de 06/07/2015) traz no bojo do artigo 88 a seguinte redação:

Art. 88. Praticar, induzir ou incitar discriminação de pessoa em razão de sua deficiência:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.

Ainda no parágrafo 2° há aumento de pena quando a prática é por meio de comunicação social ou publicação de qualquer natureza, sendo assim a condenação poderá chegar a 5 anos de reclusão.

“Na prática, isso significa que a pessoa poderá realmente ser presa e ter que cumprir pena inicialmente no regime semiaberto”, explica Leandro.

Apoio da comunidade autista e reflexão sobre o preconceito na área da saúde

Layne também afirmou ter recebido apoio da comunidade autista, sendo a médica Gabriella Dias De Assunção uma das pessoas que deixou uma mensagem motivando a jovem a seguir em busca de seus sonhos.

 
A médica Gabriella Dias De Assunção – Foto: Arquivo pessoal


Formada em dezembro de 2020, Gabriella também é autista e trabalha na enfermaria Covid e UTI semi-intensiva. Ela comenta que muitas pessoas fazem comentários preconceituosos por terem pouco conhecimento sobre o autismo e por não conviverem com autistas.

“O autista ele vive nesse limbo de ser incapacitado, depois ele é questionado sobre e, por fim, ele acaba sendo exotizado, quase assim, vou usar um termo forte, mas um pouco fetichizado”, apontou Gabriella.

A médica também alerta para o preconceito existente dentro da área da saúde. “Durante a faculdade aconteceram diversas situações, muito mais de colegas e professores do que pacientes. No geral, eu só abro meu diagnóstico para pacientes e familiares de pacientes quando é necessário e a recepção é muito boa”, avalia.

Ela considera que as pessoas se sentem livres para fazer esse tipo de comentário porque não veem transtornos mentais, emocionais e neurológicos da mesma forma que transtornos físico-orgânicos.

“Se uma pessoa falar que ela é diabética, o diagnóstico dela não vai ser questionado, mas se a pessoa falar que ela é deprimida, autista e bipolar, as pessoas vão questionar na hora”, explica.

“A psicofobia, que é o preconceito com pessoas dentro dos transtornos mentais, emocionais e neurológicos, ela é muito real e forte dentro do meio da saúde, os próprios profissionais são muito preconceituosos porque esses transtornos mostram o pouco controle que temos sobre nossos corpos”, conclui Gabriella.

Ao ser questionada sobre um conselho para a Layne, Gabriella respondeu o seguinte:

“O meu conselho é fazer terapia. Precisamos estar fortes porque vamos enfrentar coisas que outras pessoas não, mas eu posso dizer que, com o passar do tempo, as habilidades que só o nosso cérebro tem e a capacidade de sermos carinhosos e amorosos, elas vão suplantar qualquer outra coisa que as pessoas deixem no caminho. Não estou falando isso porque quero criar aquela história de superação, mas sim porque a gente também deve colher os louros do que a gente vive e não só as dificuldades”.

Sonho de ser médica e dificuldade de diagnóstico

“Eu nasci autista e a medicina veio com minhas experiências”, diz Layne, que recebeu o diagnóstico de autismo aos 13 anos – apenas na adolescência. Ela conta que aos 3 anos foi diagnosticada com depressão infantil e que, na época, foi apontado que ela nasceu com comportamentos não característicos porque sua mãe teve depressão gestacional.

“[Foi] uma das justificativas que encontraram devido a desinformação da época, e infelizmente sabemos que muitas mães carregaram ou ainda carregam culpa por seus filhos autistas, o que é cruel”, afirma Layne.

Ela relata que tinha dificuldades para se comunicar (dor, sede, fome, etc) e para se socializar, além de seletividade alimentar e hipersensibilidade auditiva. “Tudo isso fazia com que chorasse constantemente, o que ocasionou no aumento de diagnósticos como a depressão, transtorno bipolar, e até esquizofrenia”, completa a jovem.

Durante a infância, ela imitava o modo de agir das outras crianças, mas na adolescência já não conseguia fazer isso. “[Eu] era constantemente alvo de risos, xingamentos, e inúmeras humilhações. Aos treze anos receber meu diagnóstico foi uma libertação, não foi fácil, mas a partir do momento em que eu me aceitei consegui compreender quem eu sou”, conta.

“Nessa transição que meu desejo de formação em Medicina cresceu ainda mais. Quero me especializar em transtornos e também focar no TEA (Transtorno do Espectro do Autismo) para poder ajudar indivíduos autistas a não sofrer tanto assim como eu sofri, dando-lhes diagnósticos precoces”, conclui Layne.

A médica Gabriella Dias De Assunção conta que também foi bem difícil o diagnóstico, o que, segundo ela, é bem comum em mulheres. “Fui considerada ‘retardada mental’ na infância. Simples assim”, contou.