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Dançando como efeito colateral ! Alguém imaginaria ?




FESTA DE UM

Martha Medeiros

No período de 18 meses, as portas do mundo fecharam, ninguém entrou, ninguém saiu. De fronteiras a residências, isolamento foi a palavra adotada. Quem ainda circulava pelas ruas, não fazia por diversão: atendia doentes, comprava mantimentos, ia à farmácia e voltava direto pra casa, sem a habitual passadinha no bar ou na academia no final da tarde. Diante das estatísticas trágicas, e por respeito a tantas perdas, pouco se falou na solidão como efeito colateral da pandemia.

E efeito sério, solidão deprime. Não a todos - há quem lide muito bem com a própria companhia -, mas o ser humano é gregário, sente falta de se juntar, misturar, confraternizar, coisas que só agora, vacinados e aos poucos, tomando os cuidados necessários, começamos a nos atrever. Mas demorou. Antes dessa lenta alforria, foi um tal de dialogar com o espelho do banheiro, passar um tempão no sofá maratonando séries, bater papo com os amigos por WhatsApp, pedir comida por delivery e engordar. Pois é, não bastasse a deprê, solidão engorda. Muita gente ganhou uns quilinhos extras durante o recuo forçado.

Mas a gente se entrega? Se entrega nada. Crises estão aí para serem revertidas, compensadas. Se você não reparou, eu reparei: durante o confinamento, o pessoal começou a dançar entre quatro paredes. Quem estava namorando ou estava casado quando o coronavírus chegou para estragar a festa (e manteve-se heroicamente casado, apesar do excesso de grude), passou a fazer bailinho na sala, pagode na cozinha, ensaiou um tango no corredor. Uma pequena caixa de som, uma boa playlist no Spotify e quem diria? Bebida por conta da casa.

Já quem foi surpreendido pela pandemia em plena entressafra amorosa, sem um par perfeito ou imperfeito, se virou como? Do mesmo jeito. Fez festa de um. Suou a camiseta como se estivesse na pista, cantou alto sem medo de acordar a vizinhança, levantou os braços como se não houvesse amanhã - e ninguém sabia se haveria mesmo. Quem não soltou suas feras, nem caiu na gandaia, ficou mais triste e pesado.

Nunca precisei de uma ameaça global para dançar em casa, mas agora peguei gosto pra valer e enquanto não fraturar uma vértebra, continuarei com minha rave individual ou a dois (ambas as modalidades disponíveis por aqui), embalada por Fade Out Lines (The Avener), Ring My Bell (Anita Ward), Don´t Think I Could Forgive You (Tell me Lies), The Only Thing (Claptone), Save Your Tears (The Weeknd), Sunshine (Cat Dealers, LOthief, Santti), Again & Again (Oliver Tree) e outras músicas da minha playlist específica para noites incontidas. As sugestões são brinde da colunista. De nada.

Se não é meio ridículo dançar sozinho? Pode acreditar, é maravilhosamente ridículo.





Freud em Wall Street

 



Martha Medeiros

A felicidade não está concentrada nos pronunciamentos do ministro da Economia, nem na cobertura com quatro suítes anunciada no jornal, nem na concessionária da esquina. A felicidade tampouco está em algum serviço com prefixo 0900, não está em Bali e nem na farmácia que vende antidepressivo sem receita. Essa tal felicidade, mais procurada que bandido de história em quadrinhos e filho desaparecido, não mora em um único endereço. Ela tem uma escova de dentes em cada lugar.

Se não me engano foi Freud quem disse que, assim como um prudente homem de negócios não coloca todo seu capital num único investimento, não se deve esperar toda a satisfação de uma única fonte. Os riscos são altíssimos.

Digamos que seus bens restrinjam-se aos membros da sua família. Um tesouro. Mas, independente de quanto eles valham, não irão sanar as dívidas que seu coração um dia irá cobrar. O amor deles por você, por maior que seja, não será suficiente para pagar o servilismo de uma vida, a dedicação integral, o preço das fantasias não vivenciadas. Seu cônjuge, com o tempo, pode ficar maníaco, repetitivo, sem muito valor de revenda. Os filhos vão bandear-se para outros mercados e precisarão menos de sua auditoria. Família é que nem poupança, o investimento mais seguro que existe, mas fica a sensação de que se está perdendo alguma ótima oportunidade. Invista, pois, na família, mas mantenha outras reservas.

Uma profissão, pra começar. Deposite seus melhores neurônios nessa conta e corra atrás da rentabilidade.

Uma viagem. Duas. Várias. Retorno garantido, desde que você não invente de voar para zonas de conflitos.

Um hobby. Pintura, aeromodelismo, polo aquático, uma horta, origami, criação de orquídeas, voluntariado. Um prazer secreto, cuja senha de acesso só você conheça.

O excedente aplique em livros, discos, cinema, num bom par de tênis, num colchão box spring, em silêncios, luares, conversas, sexo e num computador. Na falta de dinheiro e noções de informática, vale um grosso caderno de pauta. Escreva. Sonhe. Enlouqueça uma hora por semana.

Não espere toda a felicidade de uma única fonte. É Freud ensinando como economizar lamúrias.




Oração para os vivos




Martha Medeiros

Que honremos o fato de ter nascido, e que saibamos desde cedo que não basta rezar um Pai Nosso para quitar as falhas que cometemos diariamente. Essa é uma forma preguiçosa de ser bom. O sagrado está na nossa essência e se manifesta em nossos atos de boa fé e generosidade, frutos de uma percepção profunda do universo, e não de ocasião. Se não estamos focados no bem, nossa aclamada religiosidade perde o sentido.

Que se perceba que quando estamos dançando, festejando, namorando, brindando, abraçando, sorrindo e fazendo graça, estamos homenageando a vida, e não a maculando. Que sejam muitos esses momentos de comemoração e alegria compartilhados, pois atraem a melhor das energias. Sentir-se alegre não deveria causar desconfiança, o espírito leve só enriquece o ser humano, pois é condição primordial para fazer feliz a quem nos rodeia. 

Que estejamos sempre abertos, se não escancaradamente, ao menos de forma a possibilitar uma entrada de luz pelas frestas. Que nunca estejamos lacrados para receber o que a vida traz. Novidade não é sinônimo de invasão, deturpação ou violência. Acreditemos que o novo é elemento de reflexão: merece ser avaliado sem preconceito ou censura prévia.

Que tenhamos com a morte uma relação amistosa, já que ela não é apenas portadora de más notícias. Ela também ensina que não vale a pena se desgastar com pequenas coisas, pois no período de mais alguns anos estaremos todos com o destino sacramentado, invariavelmente. Perder tempo com picuinhas é só isso, perder tempo.

Que valorizemos nossos amigos mais íntimos, as verdadeiras relações pra sempre.

Que sejamos bem-humorados, porque o humor revela consciência da nossa insignificância – os que não sabem brincar se consideram superiores, porém não conquistam o respeito alheio que tanto almejam. 

Que o mar esteja sempre azul, que o céu seja farto de estrelas, que o vinho nunca seja racionado, que o amor seja respeitado em todas as suas formas, que nossos sentimentos não sejam em vão, que saibamos apreciar o belo, que percebamos o ridículo das ideias estanques e inflexíveis, que leiamos muitos livros, que escutemos muita música, que amemos de corpo e alma, que sejamos mais práticos do que teóricos, mais fáceis do que difíceis, mais saudáveis do que neurastênicos, e que não tenhamos tanto medo da palavra felicidade, que designa apenas o conforto de estar onde se está, de ser o que se é e de não ter medo, já que o medo infecciona a mente.

Que nosso Deus, seja qual for, não nos condene, não nos exija penitências, seja um amigo para todas as horas, sem subtrair nossa inteligência, nosso prazer e nossa entrega às emoções que nos fazem sentir plenos. 

A vida é um presente, e desfrutá-la com leveza, inteligência e tolerância é a melhor forma de agradecer – aliás, a única.



Vampiros


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Martha Medeiros

Eu não acredito em gnomos ou duendes, mas vampiros existem. Fique ligado, eles podem estar numa sala de bate-papo virtual, no balcão de um bar, no estacionamento de um shopping. Vampiros e vampiras aproximam-se com uma conversa fiada, pedem seu telefone, ligam no outro dia, convidam para um cinema. Quando você menos espera, está entregando a eles seu rico pescocinho e mais. Este "mais" você vai acabar descobrindo o que é com o tempo. 

Vampiros tratam você muito bem, têm muita cultura, presença de espírito e conhecimento da vida. Você fica certo que conheceu uma pessoa especial. Custa a se dar conta de que eles são vampiros, parecem gente. Até que começam a sugar você. Sugam todinho o seu amor, sugam sua confiança, sugam sua tolerância, sugam sua fé, sugam seu tempo, sugam suas ilusões. Vampiros deixam você murchinha, chupam até a última gota. Um belo dia você descobre que nunca recebeu nada em troca, que amou pelos dois, que foi sempre um ombro amigo, que sempre esteve à disposição, e sofreu tão solitariamente que hoje se encontra aí, mais carniça do que carne. 

Esta é uma historinha de terror que se repete ano após ano, por séculos. Relações vampirescas: o morcegão surge com uma carinha de fome e cansaço, como se não tivesse dormido a noite toda, e você se oferece para uma conversa, um abraço, uma força. Aí ele se revitaliza e bate as asinhas. Acontece em São Paulo, Manaus, Recife, Florianópolis, em todo lugar, não só na Transilvânia. E ocorre também entre amigos, entre colegas de trabalho, entre familiares, não só nas relações de amor. 

Doe sangue para hospitais. Dê seu sangue por um projeto de vida, por um sonho. Mas não doe para aqueles que sempre, sempre, sempre vão lhe pedir mais e lhe retribuir jamais.



Crônicas ... Pensamentos ... Martha Medeiros



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Martha Medeiros, crônica Quando eu estiver louco se afaste



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Martha Medeiros, crônica Amor e perseguição



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Martha Medeiros, crônica Você, modo de usar



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Martha Medeiros, crônica A independência de cada um



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Nisso o sinal fechou e eu parei atrás de um caminhão, em cujo para-choque estava escrito: Não me siga que eu também estou perdido. Comecei a rir da coincidência, tive vontade de descer e ir até a boleia abraçar meu companheiro de infortúnio. Somos dois, meu irmão. Aliás, somos mais do que dois. Somos muitos. Somos todos. Não sigam ninguém, que estão todos á procura também.
Martha Medeiros, crônica Não me siga que eu também estou perdido



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Sobrenome, jóias e nariz empinado não substituem a elegância do gesto. Não há livro que ensine alguém a ter uma visão generosa do mundo, a estar nele de uma forma não arrogante. Pode-se tentar capturar esta delicadeza natural através da observação, mas tentar imitá-la é improdutivo. Educação enferruja por falta de uso. E, detalhe: não é frescura.

Martha Medeiros, crônica Avec élégance



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Martha Medeiros, crônica Entre amigos



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Martha Medeiros, livro Divã



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Martha Medeiros, crônica Confie em Deus, mas tranque o carro. www.instagram.com/frasesmarthamedeiros


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